“Sabemos que Gül vem de um movimento islamita e que é um homem religioso. Mas há dois pontos que ele não pode subestimar,” disse Ruşen Çakır, um analista político que tem seguido de perto o Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP) há vários anos. “Se ele se tornou presidente, não foi só graças à democracia, mas também graças ao secularismo, que permite que pessoas religiosas acedam ao mais alto posto do Estado. O secularismo, que significa que o Estado deve ser neutro relativamente a todas as religiões, é muito mais necessário às pessoas religiosas, do que àqueles que não são muçulmanos ou que não têm uma forte relação com o Islão,” acrescentou.
No passado, os esforços de conservadores para criarem a sua própria definição do secularismo provocaram tensões internas no país. O anterior presidente do Parlamento, Bülent Arınç, disse abertamente que havia a necessidade de redefinir o secularismo. Acentuou que o secularismo assegura a liberdade de todas as actividades religiosas, numa tentativa de fazer prevalecer a ideia de liberdade de religião. O anterior presidente, Ahmet Necdet Sezer, criticou os esforços de Arınç em descrever o secularismo à sua maneira.
Atilla Kart, um deputado do Partido Republicano do Povo (CHP) e membro da Comissão Constitucional, diz ter a impressão que Gül descreveu o secularismo em linha com o seu real propósito. Contudo, Gül devia ter focado o ponto de que a religião se tornou um instrumento de ganhos políticos e que existem esforços para impôr regras religiosas nos assuntos do Estado. Estes foram os pontos que faltam ao seu discurso,” disse Kart.
O deputado do CHP também disse que Gül tem de clarificar como é que lidaria com tal ameaça durante a sua presidência. “Este é o ponto para o qual o presidente devia dar garantias. O presidente é imparcial mas tem de estar ao lado da protecção dos princípios fundamentais e do secularismo, não só através da retórica mas com acções concretas," disse.
Entretanto, o professor de direito e ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, Mümtaz Soysal, diz que a descrição de Gül está incompleta. Gül não referiu o facto de que o secularismo requer uma total separação do Estado e dos assuntos religiosos. Gül e circulos com a mesma mentalidade, consideram o secularismo só como liberdade religiosa. “Não é bom para ele começar com tal descrição. Isto é preocupante para o futuro,” disse Soysal.
“Em democracia, que é um sistema de direitos e liberdades, o secularismo, um dos princípios seculares da nossa República, é não só um modelo que permite a liberdade de diferentes estilos de vida, como é também uma regra de harmonia social. O compromisso com o princípio do secularismo é também a via mais expediente para se eliminarem conflitos e elementos de altercação que de tempos a tempos se manifestam em todas as sociedades. Quando pensarmos nas realidades e sensibilidades inerentes à nossa geografia, compreenderemos melhor o significado do princípio do secularismo, que também garante a liberdade de religião e de consciência.”