(Foto: Lídia Lopes)
Após quase 60 dias de greve, cerca de dois mil trabalhadores da antiga tabaqueira estatal turca, Tekel, prosseguem a sua luta pelos postos de trabalho acampados no centro de Ancara.
No Domingo, 7, milhares de trabalhadores da Tekel, voltaram a encher de protestos as ruas de Ancara. Na quinta-feira, 4, seis centrais sindicais convocaram uma greve nacional de solidariedade que afectou vários sectores de actividade (administração e transportes, sobretudo), no âmbito da qual se realizaram duas grandes manifestações com 20 mil pessoas em Ancara e 15 mil em Izmir.
Nesse mesmo dia, cerca de 200 dos dois mil trabalhadores oriundos de várias regiões, que estão acampados na capital, iniciaram mais uma greve de fome. A abstinência já conduziu vários deles ao hospital gravemente debilitados.
Mas após quase dois meses de uma dramática greve contra a destruição da tabaqueira nacional, o governo do primeiro-ministro liberal, Recep Tayyip Erdoğan, continua surdo às razões gritadas até à exaustão por famílias inteiras, cuja sobrevivência dependia do seu trabalho naquela que foi uma das empresas estatais mais lucrativas do país.
O desmembramento da Tekel começou ainda em 2003, quando o governo decidiu vender a sua divisão de bebidas. Dos mais de 3500 trabalhadores, menos de metade conservou os seus empregos. Hoje, desse sector restam pouco mais de 300 trabalhadores, menos de dez por cento do efectivo anterior à privatização. A maioria das fábricas foi encerrada.
Na altura, porém, o importante sector dos tabacos manteve-se nas mãos do Estado, continuando a garantir emprego a mais de 12 mil trabalhadores directos, em cerca de uma centena de unidades espalhadas por várias regiões.
Mas a avidez dos monopólios transnacionais não tardou a cobiçar o grande mercado turco dos tabacos, e contou para isso com a ajuda do governo de Erdoğan e com a pressão do Fundo Monetário Internacional.
Comprar para fechar
Em 2008, a British American Tobacco (BAT), segundo monopólio mundial, adquiriu a Tekel por 1,72 mil milhões de euros. O objectivo era fechar as fábricas e eliminar um concorrente. Faltava encontrar um expediente para pôr 12 mil trabalhadores na rua.
Erdoğan produziu então um decreto oferecendo um contrato de trabalho precário, por 11 meses, nos serviços da administração do Estado aos trabalhadores das empresas públicas privatizadas.
Todavia, para além da precariedade, os salários serão reduzidos para menos de metade e grande parte dos direitos anteriores não são reconhecidos, designadamente o estatuto de funcionário público. Sindicatos e trabalhadores recusaram. Não podia haver acordo.
Furioso por os trabalhadores terem rejeitado a côdea de pão que lhes estendia, e preferirem "morrer com dignidade a viver na miséria", suportando na rua os rigores de um Inverno glacial há quase 60 dias, Edroğan mudou de táctica e passou à ameaça.
Na semana passada, o primeiro-ministro engrossou a voz, falou de "um movimento ideológico contra o governo", denunciou uma "instrumentalização do conflito", e ameaçou fazer evacuar as ruas da capital pela força.
Desde 2002, várias centenas de empresas públicas foram privatizadas pelos conservadores islâmicos do Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP, no poder). Na calha estão agora a lotaria nacional, as centrais eléctricas e fábricas de açúcar, entre outras. De todas estas empresas, a Tekel era a mais rentável. O plano é supervisionado pelo FMI com o qual o governo turco negocia desde há um ano um novo empréstimo.
(Fonte: Jornal Avante)