In Diário de Notícias
Imaginem um país em que um jornal oferece um poster de Kemal Atatürk, o fundador do regime republicano-laico sobre o qual assenta a Turquia moderna. Dá para perceber a veneração que os turcos sentem por esse político excêntrico, mulherengo e alcoólico que era Atatürk, que morreu em 1938 com 53 anos. Atatürk foi o inspirador de um avançado projecto de secularização e ocidentalização que impôs uma revolução de costumes na sociedade turca. Pôs os turcos a vestirem-se à ocidental - botas, calças e chapéu -, baniu o véu islâmico e lutou por uma Turquia livre do espírito do Islão. As mulheres que adquiriram sob o regime de Atatürk uma relativa igualdade de direitos, sabem o que lhe devem.Não admira que no centro desta eleição presidencial não estejam só Abdulah Gül e Recep Erdoğan mas também a mulher do primeiro, Hayrunisa Gül, de 42 anos, que não irá prescindir do véu se o marido se tornar presidente. No passado ela chegou a apelar ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem para poder usar o véu numa universidade turca. A oposição secularista não aceita que esta activista do véu se torne na primeira mulher de um presidente turco. O presidente em funções, Ahmet Sezer, já disse que não a tenciona convidar para a tomada de posse. E, quando Gül ainda não tinha sido confirmado pelo AKP, quer o CHP quer a oposição esquerdista do DSP anunciaram que apoiariam a candidatura do ministro do Trabalho, Murat Başesgioğlu, cuja mulher não usa véu. Hayrusina Gül parece querer modernizar o véu, com a ajuda de estilistas de moda. Mas o símbolo do véu tem servido de mote para condenar a candidatura do marido. Não por acaso, Erdoğan veio citar o exemplo da mulher do próprio Atatürk, Latife Hamas, que num período da sua vida também envergou o véu. O CHP repudiou a comparação e alguns historiadores desmentiram o primeiro-ministro: a mulher de Ataturk nunca usou o véu durante o tempo em que esteve casada, nem depois de se divorciar. Mas Erdogğn estuda cada sua intervenção com minúcia: a sua base social de apoio compõe-se de grandes proprietários islâmicos da Anatólia, mas também das classes urbanas que parecem dispostas a aceitar Gül, desde que isso não ponha em causa o secularismo do Estado turco. Um inquérito realizado há uns anos colocou a questão do véu no oitavo lugar das preocupações centrais dos turcos. Como diziam alguns comentadores, os turcos querem sobretudo estabilidade, reformas e crescimento. Para outros, Gül na presidência da Turquia até pode ser o sonho cumprido de Atatürk. Quando Gül promete manter-se fiel à Constituição e à herança secular, adopta o discurso conciliador que as circunstâncias exigem. Também aqui há a Turquia dos jornais e a Turquia das ruas.
Imaginem um país em que um jornal oferece um poster de Kemal Atatürk, o fundador do regime republicano-laico sobre o qual assenta a Turquia moderna. Dá para perceber a veneração que os turcos sentem por esse político excêntrico, mulherengo e alcoólico que era Atatürk, que morreu em 1938 com 53 anos. Atatürk foi o inspirador de um avançado projecto de secularização e ocidentalização que impôs uma revolução de costumes na sociedade turca. Pôs os turcos a vestirem-se à ocidental - botas, calças e chapéu -, baniu o véu islâmico e lutou por uma Turquia livre do espírito do Islão. As mulheres que adquiriram sob o regime de Atatürk uma relativa igualdade de direitos, sabem o que lhe devem.Não admira que no centro desta eleição presidencial não estejam só Abdulah Gül e Recep Erdoğan mas também a mulher do primeiro, Hayrunisa Gül, de 42 anos, que não irá prescindir do véu se o marido se tornar presidente. No passado ela chegou a apelar ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem para poder usar o véu numa universidade turca. A oposição secularista não aceita que esta activista do véu se torne na primeira mulher de um presidente turco. O presidente em funções, Ahmet Sezer, já disse que não a tenciona convidar para a tomada de posse. E, quando Gül ainda não tinha sido confirmado pelo AKP, quer o CHP quer a oposição esquerdista do DSP anunciaram que apoiariam a candidatura do ministro do Trabalho, Murat Başesgioğlu, cuja mulher não usa véu. Hayrusina Gül parece querer modernizar o véu, com a ajuda de estilistas de moda. Mas o símbolo do véu tem servido de mote para condenar a candidatura do marido. Não por acaso, Erdoğan veio citar o exemplo da mulher do próprio Atatürk, Latife Hamas, que num período da sua vida também envergou o véu. O CHP repudiou a comparação e alguns historiadores desmentiram o primeiro-ministro: a mulher de Ataturk nunca usou o véu durante o tempo em que esteve casada, nem depois de se divorciar. Mas Erdogğn estuda cada sua intervenção com minúcia: a sua base social de apoio compõe-se de grandes proprietários islâmicos da Anatólia, mas também das classes urbanas que parecem dispostas a aceitar Gül, desde que isso não ponha em causa o secularismo do Estado turco. Um inquérito realizado há uns anos colocou a questão do véu no oitavo lugar das preocupações centrais dos turcos. Como diziam alguns comentadores, os turcos querem sobretudo estabilidade, reformas e crescimento. Para outros, Gül na presidência da Turquia até pode ser o sonho cumprido de Atatürk. Quando Gül promete manter-se fiel à Constituição e à herança secular, adopta o discurso conciliador que as circunstâncias exigem. Também aqui há a Turquia dos jornais e a Turquia das ruas.
Sem comentários:
Enviar um comentário