18 junho 2008

A vitória inesquecível da Turquia


O Campeonato Europeu de Futebol viveu um daqueles momentos que não passa pela cabeça de ninguém, um jogo impróprio para cardíacos, um daqueles momentos de futebol que deixa meio estádio num pranto e a outra metade com uma vontade incontrolável de saltar para a relva e celebrar com os seus heróis.
“Os detalhes são a única coisa que interessa”, disse um dia Oscar Wilde. O Euro ganhou o dia.
O Turquia-República Checa foi morno. O Turquia-República Checa foi o jogo mais quente e entusiasmante do mundo. Os Checos mereciam ter ganho ou não havia como tirar esta vitória aos Turcos? Os melhores guarda-redes do mundo também são humanos ou será que os jogadores é que têm o poder de se transformarem em deuses?
Quando aos 34 minutos o jogador mais alto do Europeu, no alto dos seus 2,02 metros, marcou o primeiro golo da noite, o encontro era apenas isso. Genebra assistia a um jogo frio, sem técnica e onde o único rasgo individual era o efeito centímetros de um jogador que, perto dos Turcos liliputianos, parecia um Gulliver mandão.
No preciso momento em que Grygera recebeu a bola no corredor direito e, lesto, avançou no terreno, percebeu-se que só havia uma coisa a fazer. Faz parte dos manuais. Sempre que uma equipa tiver no seu plantel o jogador mais alto de um torneio e sempre que esse jogador estiver em campo e a ganhar todas as bolas que há para ganhar, é na direcção dele que o jogo tem que continuar a evoluir. E assim foi. O centro nem sequer saiu muito tenso do pé do lateral-direito, mas a bola foi ter direitinha à cabeça rapada. Gunkor e Cetin estavam lá. Era como se não estivessem.
Mas essa história estava ainda no prefácio. As surpresas, os momentos de glória e de desespero estavam todos guardados para uma segunda parte que ficará na história da competição pelos bons e pelos maus momentos – tudo depende da perspectiva. Começou em Fatih Terim, que, sem nada a perder, lançou Sabri e Kazim Kazim para tentar aumentar as probabilidades lá na frente.
A espaços, parecia consegui-lo. A espaços, eram os Checos que queriam mais. Era Koller, que só não marcou porque não tem os pés tão calibrados como a cabeça. Era Plasil, que passou por entre a chuva para gelar metade do estádio (a bola viajou da direita para a zona Koller, mas este encolheu-se e deixou para a segunda vaga). Faltava sensivelmente meia hora para o jogo acabar. E apenas os Turcos acreditavam que o milagre dos golos pudesse bater-lhes à porta novamente.
Como tinha acontecido no Suíça-Turquia – como tem, aliás, acontecido um pouco por todo o Europeu –, voltou a chover. Como tinha acontecido no jogo anterior, Arda Turam voltou a marcar um golo de emergência, transmitindo aos adeptos um sentimento de esperança que se propagou aos seus colegas de equipa. A Turquia estava agora em todo o lado. A República Checa, encolhida, esperava pelo apito final. No centro de Dublin está uma frase do sindicalista Jim Larkin cravada numa pedra. “Os grandes parecem grandes porque estamos de joelhos. Levantemo-nos”.
Entretanto, a Turquia já se reerguera. Os Checos vão à frente? Já não. Centro largo da direita. Esta é de Petr Cech, um dos melhores guarda-redes do mundo. Não, é de Nihat Kahveci, um dos guerreiros da última investida turca. A bola escapou a Cech e quis cair aos pés de quem a merecia. Empate. Vamos estrear as grandes penalidades. Vai um Panenka? E porque não outro Nihat? Até então desesperado, o estádio enlouqueceu com um pontapé demolidor de fora da área. Festa digna de um verdadeiro campeão da Europa nas bancadas.
Pouco depois, Demirel foi expulso (por suposta agressão ao jogador mais alto do Europeu, que se despenhou). Tuncay pegou nas suas luvas, no seu escudo e esperou pelo inimigo. Se o duelo seguisse para penáltis, estaria lá um bravo turco para os deter.

(Fonte: Público)

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