A Turquia é a convidada de honra da edição deste ano Feira do Livro de Frankfurt mas cerca de 20 escritores e críticos literários turcos negaram-se a participar no certame. Entre eles, estão alguns dos mais consagrados autores da moderna literatura nacional que, em declaração conjunta, acusam o governo pró-islâmico de Recep Erdoğan de "não ter o direito de representar a cultura e a literatura turcas". Na comitiva oficial dos escritores estará também o autor de "best-sellers" Murat Han Mungan, que se declarou publicamente homossexual, num país em que o "coming out" está longe de já ser uma evidência. Quanto ao vencedor do Prémio Nobel, Orhan Pamuk, já foi várias vezes vítima da intolerância nacionalista e só recentemente viu arquivado um processo contra si em tribunal, por ter afirmado que a Turquia praticou um genocídio sobre o povo arménio. Mas a verticalidade de Pamuk dá frutos: vários intelectuais exigiram a abolição do Parágrafo 301 do Código Penal Turco, que castiga "Ofensas à Identidade Turca" e, claro, espera-se que a questão do (des)respeito pelos direitos humanos na Turquia seja um dos grandes temas a debater na Feira do Livro. A avaliar pelos temas dos colóquios em torno da participação turca - Libertação da Mulher, Migrações e Liberdade de Opinião, a par de Futebol, Música e Humor, mas também do Papel do Islão na Turquia - o interesse dos debates parece garantido. Polémicas à parte, a Turquia enviou a Frankfurt uma embaixada de mais de 200 escritores, liderada por Orhan Pamuk e "A Turquia em todas as suas Colorações" é o lema escolhido para apresentar o país, que tem na Alemanha uma comunidade de quase três milhões de pessoas. Em vésperas da Feira, foram traduzidos de Turco para Alemão cerca de 400 títulos, número impressionante que leva os organizadores do certame a pensar que este ano poderá ser batido um recorde de afluência, e alcançar-se a marca dos 300 mil visitantes até Domingo. Desde que o Germano-turco Fatih Akin ganhou o Festival de Cinema de Berlim, em 2004, com "Geggen die Wand" (A Noiva Turca), a Alemanha ficou a saber que existe uma elite turca nascida no país de acolhimento, e que Turquia não é sinónimo de Anatólia, a sua região mais pobre e menos alfabetizada. A presença em Frankfurt vai ser aproveitada, assim, para desfazer alguns mitos, e mostrar a pujança da cultura turca, garantem os responsáveis. "Quem abrir os olhos, verá na nossa música, na nossa arte, na nossa literatura e arquitectura influências dos Balcãs, do Irão, do mundo árabe, e traços de diferentes grupos étnicos, linguísticos e religiosos", afirmam num documento de apresentação. "Esta é a oportunidade que esperávamos, e não vamos desperdiçá-la", garante a editora turca Müge Gürsoy, vice-presidente do Comité de Organização do seu país na Feira de Frankfurt. Na era pré-islâmica, as histórias de nómadas marcaram os primórdios da literatura turca que, mais tarde, no Império Otomano, esteve sob forte influência persa e árabe. Com a fundação da República, em 1923, o lema passou então a ser a aproximação dos escritores ao povo. As reformas introduzidas por Mustafa Kemal Atatürk e a opção pelos caracteres latinos em detrimento dos árabes, em 1928, marcaram outra grande mudança. Para contar tudo isto, e muito mais, a Turquia vai ter em Frankfurt, além dos escritores, cerca de 700 artistas, de músicos a pintores, e levar a cabo dezenas de actividades.
(Fonte: Lusa, RTP)
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