Os líderes de cinco dos seis países parceiros na construção do gasoduto Nabucco – que visa diminuir a dependência energética europeia dos fluxos de gás natural da Rússia – assinaram esta manhã em Ancara um acordo intergovernamental para pôr em marcha o projecto, contando ainda com a presença de importante simbolismo do presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso.
Anfitrião do encontro, o primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdoğan – que assinou o documento junto com os homólogos da Áustria, Hungria, Bulgária e Roménia – sublinhou que este é apenas o momento de arranque do gasoduto desenhado para levar até à Europa gás natural da Ásia Central, sem passar pela muito eficiente máquina russa de produção e distribuição deste combustível. “O trabalho não acabou com a assinatura, pelo contrário, começa agora”, avaliou, avançando que é desejo dos parceiros investidos na construção do Nabucco – em que se inclui também a Alemanha, ausente do encontro – que “o Irão adira quando as condições assim o permitirem”.
Erdoğan manifestou igualmente o desejo de que a Rússia venha um dia a participar no Nabucco, algo em que os analistas não expressam confiança uma vez que Moscovo tem os seus próprios planos de distribuição do combustível para aquela região: o gasoduto SouthStream, concebido depois de a União Europeia ter revelado, em 2002, intenções de construir o Nabucco, e projectado para fazer chegar o gás russo à Itália, através da Turquia, Sérvia, Hungria e Áustria sem passar pela Ucrânia, país com o qual Moscovo mantém constantes disputas gasíferas que, já por duas vezes, afectaram os fornecimentos para países europeus.
Apesar do sinal político hoje dado, de empenho dos países europeus no Nabucco, ideia que goza do apoio expresso também dos Estados Unidos, que disputam com a Rússia esferas de influência geopolítica na Ásia Central, muitos analistas põe em causa não apenas a efectiva rentabilidade do projecto como o seu financiamento.
A construção do Nabucco – mais de 3300 quilómetros de gasodutos a ligar a Turquia à Áustria através da Bulgária, Roménia e Hungria, com capacidade de “bombar” anualmente 31 mil milhões metros cúbicos de gás – está orçada em 7.9 mil milhões de euros. Mesmo com dois bancos europeus a terem manifestado vontade em financiar o projecto, previsto para estar operacional em 2014, os efeitos da presente crise económica global não dão boas premonições.
E de onde virá o gás?
Outra grande dúvida prende-se com a rentabilidade do Nabucco, com muitos analistas a sublinharem os riscos políticos que lhe estão inerentes, dado o terreno geopolítico difícil do seu traçado – a começar pelo principal nó de distribuição: a Geórgia, que no Verão passado travou uma guerra com a Rússia depois de Tbilissi tentar retomar o controlo das suas repúblicas secessionistas e pró-russas da Abkházia e Ossétia do Sul. A isto acresce que o projecto tem como principais fornecedores do gás o Azerbaijão, Turquemenistão e, possivelmente, o Irão, o Iraque e a Síria. Actualmente, porém, a Rússia – de cujos fornecimentos a Europa depende em um quarto do seu consumo – tem em vigor um acordo com o Turquemenistão que faz da gigante gasífera estatal russa Gazprom a compradora exclusiva das exportações de gás daquele país, apesar de o regime de Ashgabat ter dito na sexta-feira que gostaria de se associar ao Nabucco. O Azerbaijão é até agora a aposta mais segura do gás da Ásia Central de que o gasoduto europeu carece para funcionar, mas as suas reservas são tecnicamente insuficientes e, também aqui, já a Rússia se adiantou, tendo assinado no final do ano passado um acordo para comprar as exportações de Baku. A União Europeia continua, de resto, ainda à espera de sinais positivos de países fornecedores cruciais na Ásia Central como o Cazaquistão e o Uzbequistão, cujo gás é vital para alimentar o Nabucco. E é também de assumir como muito provável que tanto Moscovo como Teerão se oponham à passagem do Nabucco sob o Mar Cáspio, uma crucial etapa técnica do traçado do gasoduto.
(Fonte: Público)
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