Cumpre bem o seu papel Cavaco Silva ao alentar as esperanças da Turquia na adesão à União Europeia, mas as negociações entre Ancara e Bruxelas vão arrastar-se muito mais do que os sete anos que Portugal precisou para entrar na CEE e não existe qualquer garantia de que venham a ser bem sucedidas. As conversações encetadas em Outubro de 2005 não culminarão num acordo em 2013, conforme pretendera inicialmente o primeiro-ministo Recep Erdoğan, e a persistente oposição na França, na Alemanha, na Áustria e na Grécia à entrada da Turquia compromete a eventual adesão turca que, em último recurso, poderá ser vetada por qualquer destes Estados. Apenas um dos 35 capítulos do processo formal de negociações foi concluído ("Ciência e Pesquisa"), outros oito entretanto abertos estão congelados e até a discussão do dossiê "energia" está em causa devido ao veto do Chipre.
Um estendal de bloqueios
Na ilha dividida desde 1974, a eleição do presidente Demetris Christofias deu a partir do ano passado novo ímpeto às negociações com o seu homólogo turco Mehmet Ali Talat para criação de um Estado federal, mas os resultados foram nulos até agora. A vitória de nacionalistas de direita nas eleições legislativas do mês passado no norte de Chipre, seguida da decisão do Tribunal Europeu de Justiça que obriga a União Europeia a reconhecer os direitos de Cipriotas gregos sobre propriedades em disputa na zona turca, paralisou as negociações. O impasse em Chipre voltou ao ponto em que se encontrava quando o acordo de reunificação proposto pela ONU foi rejeitado em 2004 pelos Cipriotas gregos. Os Cipriotas turcos continuam a interditar o tráfego de navios e aviões cipriotas gregos, enquanto Ancara rejeita o estatuto de Chipre como Estado membro da União Europeia e continua a ser o único país a reconhecer a República Turca do Norte de Chipre. As reformas promovidas pelo governo turco nas áreas dos direitos humanos, estatuto das mulheres e da minoria curda são ainda insuficientes para satisfazer os critérios da União Europeia e persiste a tensão entre os militares, Erdoğan e o presidente Abdullah Gül, eleito em 2007 pelo Partido da Justiça e do Desenvolvimento. Em Julho do ano passado a interdição do Partido da Justiça e do Desenvolvimento - no poder desde Março de 2003 - por alegado crime de subversão do estatuto laico do Estado, chumbou no Tribunal Constitucional pela diferença de apenas um voto (seis dos onze juízes votaram pela dissolução, aquém, portanto, da maioria necessária de sete votos) tendo sido assim evitada "in extremis" uma crise institucional. O processo aberto em Outubro de 2008 contra a rede militar clandestina ultra-nacionalista Ergenekon, acusada de terrorismo e conspiração, continua, por sua vez, a inquinar as relações entre as forças armadas e os islamitas.
Um desenvolvimento positivo
Além da progressiva normalização das relações com a Grécia, a perspectiva do estabelecimento de relações diplomáticas entre a Turquia e a Arménia, apesar das reticências do Arzebaijão que teme perder o apoio de Ancara para recuperar os territórios perdidos para Erevan na guerra de 1991-1994, é o desenvolvimento mais prometedor para sustentar as aspirações turcas a uma integração europeia. O desanuviamento entre Turcos e Arménios contribuiu para que a Turquia, bem como o Arzebaijão e a Geórgia, acedesse na semana passada a participar no gasoduto Nabucco, mas Ancara, apesar de ter desistido das exigências de um desconto de 15 % na compra do gás que passe pelo seu território, faz depender a efectiva participação no projecto da abertura a curto prazo do dossiê energético nas negociações com Bruxelas. A viabilidade do gasoduto de 3300 quilómetros para transporte de gás do Cáspio via Turquia, Bulgária, Roménia e Hungria para a Áustria, orçado em cerca de oito mil milhões de euros, depende ainda da garantia de acesso a fornecimentos do Turquemenistão - além das vendas em menor escala do Cazaquistão e Uzbequistão - e eventuais complicações políticas em Ancara ou no Cáucaso podem adiar o início dos trabalhos de construção previsto para 2011. A Turquia adquire 63 % do gás natural que consome à Rússia e tal como a União Europeia, dependente de Moscovo para 40 % das importações, tem particular interesse na concretização do Nabucco o que limita a sua capacidade negocial frente a Bruxelas.
Um apoio bem necessário
O apoio de Portugal às aspirações europeias da Turquia, reiterado por Cavaco Silva, é deveras importante porque vai ao arrepio dos temores religiosos e demográficos de Alemães ou Franceses e sublinha a importância estratégica turca no Médio Oriente e no Mar Negro. O alento que o presidente leva à Turquia assume, ainda, grande significado conjuntural dado que em Dezembro a União Europeia terá de fazer o ponto da situação nas negociações com Ancara que estão, para efeito práticos, bloqueadas. Será um alento bem necessário, mas, de facto, a eventual adesão turca dificilmente se concretizará mesmo no final da próxima década e serão necessárias grandes mudanças no xadrez internacional para ultrapassar a obstinada oposição de Alemães, Franceses, Austríacos e Gregos à integração de um Estado que de imediato se tornaria no maior país da União.
(Fonte: Jornal de Negócios)
13 maio 2009
O alento de Cavaco Silva à Turquia
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