01 abril 2007

Bülent Arınç: "Europa não é clube cristão e permanece prioridade turca"

Bülent Arınç, o presidente da Grande Assembleia Nacional da Turquia, esteve em Lisboa. O destino da Turquia é a Europa, garantiu.

No dia em que falou em Lisboa com o "Público", em Bruxelas, os representantes dos estados membros retomavam finalmente as negociações de adesão com a Turquia. Uma boa notícia no meio do duche escocês a que a União tem sujeitado Ancara nos últimos meses, com a multiplicação de sinais contraditórios, mais negativos do que positivos, sobre o seu lugar na Europa. Nada parece, no entanto, perturbar as certezas do presidente da Grande Assembleia Nacional da Turquia, Bülent Arınç, membro do partido islamita moderado no poder, o Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP). O seu percurso político acompanha, aliás, a história conturbada dos islamitas moderados, num país com uma tradição política ferozmente secular. Eleito deputado pelo Partido da Prosperidade (Reffah), que liderou um Governo efémero em 1996, para ser destituído pelos militares por atentar contra a identidade secular da Turquia. Foi de novo eleito pelo seu "filho", o mais moderado Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP), do primeiro-ministro Recep Tayyip Erdoğan, no poder desde 2002 e que detém uma imensa maioria parlamentar.
A necessidade de tradução simultânea (do Inglês para o Turco e vice-versa) torna as suas certezas ainda mais absolutas. Respostas breves e de acordo com as posições oficiais da Turquia. A opção estratégica pela Europa "é de há muitos anos e não vai mudar". A Europa "não é um clube cristão", seja o que for que a chanceler Merkel ou o Papa digam sobre isso. Apesar do refluxo provocado pelas humilhações europeias, a opinião pública "regressará ao antigo entusiasmo pela adesão da Turquia". Aliás, Arınç não atribui apenas às hesitações e às contradições da União a efervescência nacionalista e extremista que tem marcado a vida política turca nos tempos mais recentes. Diz que se trata apenas "de forças marginais", sem grande expressão na opinião pública. Explica-as também pela confluência de inúmeros factores: "Chipre, o agravamento do conflito israelo-palestiniano, o Iraque e, claro, a questão do alegado genocídio arménio." Tudo isto, afirma, alimenta uma atitude negativa", que não é apenas em relação à Europa, mas também aos Estados Unidos." O último episódio que irritou Ancara foi a ausência de convite para as celebrações do Tratado de Roma em Berlim, no fim-de-semana passado. O chefe da diplomacia turca, Abdullah Gül, acusou a União de não olhar para o futuro. O primeiro-ministro Erdoğan foi mais duro: "Se a União Europeia tem pensamentos negativos sobre a Turquia, então devia tomar desde logo as suas decisões em conformidade, para que nós possamos continuar no nosso próprio caminho." "Teria sido desejável que a Turquia, como país candidato e já a negociar a adesão, tivesse sido convidada," diz Arınç. Lembra que ele próprio esteve presente nas celebrações de Roma, organizadas pelo Senado italiano, onde discursou. Mas não se deixa cair na tentação, implícita nas palavras de Erdoğan, de Ancara resolver um dia destes inverter a marcha em direcção à Europa e começar a olhar mais para leste. O que lhe interessa sublinhar é o papel da Turquia como "ponte", como "intermediário", mesmo nos casos em que o diálogo parece impossível, como em relação ao Irão. Primeiro, lembra que a Turquia alinha com os países europeus nas decisões internacionais. "O Irão é um país vizinho. A Turquia cumpre as resoluções do Conselho de Segurança da ONU. Dizemos sempre às autoridades iranianas que, embora favorecendo a utilização pacífica do nuclear, eles devem cumprir as determinações internacionais e agir com transparência." Dá o exemplo dos 15 marines britânicos capturados pelo Irão no dia 23. "O primeiro-ministro [Erdoğan] esteve na cimeira da Liga Árabe em Riad [na quarta-feira] e esforçou-se por negociar a libertação imediata dos marines britânicos." Mas regressa sempre à casa de partida: "A opção turca pela Europa não vai mudar. As dificuldades das negociações acontecem connosco mas também com outros candidatos. Não vamos abrandar a nossa determinação e ultrapassaremos todos os obstáculos." Lembra o longo caminho percorrido pela Turquia para adaptar a sua legislação aos padrões exigidos pela UE em matéria de democracia, direitos humanos e direitos das minorias. "Mais de 40 artigos da Constituição e cerca de uma centena de leis já foram alterados," diz. "Em termos de legislação, já não há muito mais a fazer." Garante que o polémico artigo 301 do Código Penal, que criminaliza os ataques à identidade nacional turca, estará revisto dentro de meses. É ao abrigo deste artigo que os tribunais têm julgado, e por vezes condenado, intelectuais, escritores e jornalistas, nomeadamente sempre que invocam a questão do genocídio arménio. Finalmente, recusa-se a comentar o facto mais controverso da vida política turca: se Tayyip Erdoğan se vai ou não candidatar à presidência da República. Para os sectores seculares que desconfiam dos verdadeiros objectivos dos islamitas moderados, tal significaria a concentração total de poderes nas suas mãos. O actual presidente, Ahmet Sezer, representa os sectores secularistas e é olhado como um "moderador" das tentações mais radicais dos islamitas. Para Bülent Arınç, ele próprio considerado um potencial candidato, ainda é cedo para saber como vai ser. Meio a rir, meio a sério, diz que 16 de Abril será o dia da clarificação.

(Fonte: Público)

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