Está terminado. No parque Gezi, em lugar dos manifestantes, polícias sentam-se à porta das tendas, fumam cigarros juntos às bancas anarquistas. Não passaram mais de duas horas, desde o momento em que a força de intervenção começou o ataque e aquele em que todos os ocupantes tinham fugido. Às 11 horas da noite toda a área estava cercada, todos os acessos bloqueados. A zona de Taksim estava coberta de fumo e de silêncio. Ouvia-se apenas o som de sirenes de ambulâncias ao longe.
A polícia de intervenção lançou o ataque cerca das 9 da noite, disparando canhões de água e granadas de gás lacrimogéneo, lançando em fuga e pânico os milhares de manifestantes. De forma lenta e sistemática, avançou por entre o arvoredo, tendas e toda a “mobília” que os manifestantes deixaram para trás, após duas semanas de ocupação do parque.
O alarme foi dado às 8 da noite. Correu célere entre os manifestantes que ocupavam o parque Gezi. “Os polícias estão a levantar-se”, disseram. “Estão a preparar-se para atacar”. Os planos de emergência começaram imediatamente a ser colocados em prática. As máscaras anti-gás foram colocadas, abertos os corredores de segurança. Os vendedores de equipamento anti-gás lacrimogéneo despachavam freneticamente as últimas bugigangas.
“É falso alarme”, disse Cenolut, de 34 anos, sem colocar a máscara. “O primeiro-ministro, Erdoğan, disse num comício que limparia o parque amanhã. Portanto será amanhã, não hoje. E amanhã já não estará aqui quase ninguém”.
Muitos manifestantes estavam convencidos disto e preparavam-se para abandonar o parque amanhã, domingo.
Consideravam que a mensagem tinha sido ouvida e a sua missão cumprida. Tiveram uma surpresa.
O ataque da polícia começou pouco antes das 9 horas. Os jactos de água dos veículos blindados Toma deram o sinal. Granadas de gás foram lançadas para o interior do parque. Centenas de polícias avançaram pela praça Taksim, em direcção ao parque, como não tinham feito no ataque anterior.
Tudo se encheu de fumo, ouviram-se muitas explosões e tiros. A multidão desatou a correr em direcção ao outro extremo do parque. As granadas rebentavam junto aos seus pés. A concentração de gás pimenta tornou-se intensa, o ar irrespirável. Muitos manifestantes precisaram de assistência, outros tombaram no chão.
“Veja o que está a acontecer! Veja isto!”, gritou Yeliz, 34 anos, uma gestora de produto numa empresa privada que nos tinha dito que abandonaria o parque amanhã. “Escreva isto! Escreva! Tenho vergonha do que está a acontecer no meu país”. E desapareceu na multidão, aos tropeções.
No extremo norte do parque Gezi, os manifestantes em fuga descobriram que a polícia tinha já também tomado posições nas ruas confluentes. Os agentes envergavam os capacetes e escudos mas mantinham-se imóveis. Muitos manifestantes passaram por eles, uns aos gritos, outros entoando slogans. Os polícias deixaram-nos passar. O objectivo era esse.
Em vários pontos dos arredores de Taksim, activistas montaram barricadas, para continuar a resistência à polícia. Atiram pedras e disparam fisgas, ao que a polícia responde com gás lacrimogéneo. Toda esta zona da cidade está envolvida numa nuvem de gás tóxico.
A resistência dos activistas não tem, porém, a dimensão da que opuseram na última intervenção da polícia, terça-feira, dia 11. Nessa altura, as forças policiais ocuparam a praça Taksim, mas deixaram incólume a “zona livre” de Gezi. E era daí, do interior do parque, que chegavam as armas e os reforços para combater a polícia.
Desta vez, o parque foi evacuado, todas as ruas previamente cortadas. Sem espaço nem apoio, nenhum foco de resistência dura muito tempo.
É impossível entrar agora no parque, sob controlo da polícia. Mas segundo os testemunhos de vários activistas, a intervenção deixou muitas pessoas feridas, incluindo idosos e crianças. Os que não resistiram ao gás e às balas de borracha e ficaram em Gezi foram levados para ambulâncias, que estavam já à espera, guardadas pela polícia.
Outros feridos refugiaram-se num hotel situado no extremo norte do parque, o Hotel Divan, que abriu as portas para auxiliar os manifestantes. A polícia cercou o hotel, não permitindo entrar nem sair, mas, segundo manifestantes que estiveram lá, não entrou nem tentou deter quem ali se refugiou.
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