06 novembro 2006

Bülent Ecevit: Uma lenda da política turca


Bülent Ecevit (1925-2006) nasceu em Istambul. O seu pai, Ahmet Fahri Ecevit nasceu em Kastamonu (norte da Turquia) e foi professor de medicina forense na universidade de Ancara. Entre 1943 e 1950, Ahmet Fahri iniciou a sua vida política como deputado do CHP (Partido Republicano do Povo) por Kastamonu. A sua mãe, Fatma Nazlı, nasceu em Istambul e era pintora.
Em 1944, Ecevit terminou o liceu no Robert College de Istambul e começou a trabalhar como tradutor na Direcção Geral de Imprensa. Foi para os Estados Unidos em meados dos anos 50 com uma bolsa de estudo, e trabalhou para dois jornais na Carolina do Norte.
Ecevit foi eleito para o parlamento turco em 1957, como deputado do Partido Republicano do Povo (CHP) pela província de Zonguldak. Em 1974, sucedeu a Ismet Inönü como líder do Partido Republicano do Povo (CHP) em coligação com o Partido da Salvação Nacional (MSP) de
Necmettin Erbakan. Foi eleito primeiro-ministro, e o feito mais notório do seu governo foi ter ordenado uma intervenção militar a 20 de Julho de 1974, para prevenir um golpe de Estado das forças gregas em Chipre, dividindo a ilha e preparando o cenário para a fundação da república turca do norte do Chipre (um Estado de facto que só é reconhecido oficialmente pela Turquia).
Bülent Ecevit revelou que soube pela primeira vez da existência do Gladio, um exército secreto da NATO, em 1974, e suspeitou da existência de uma “contra-guerrilha”, o ramo turco do Gladio. Essa "contra-guerrilha" terá sido responsável pelo massacre de 1 de Maio de 1977 na praça Taksim em Istambul, durante o qual franco-atiradores dispararam contra 500 000 cidadãos presentes num comício de protesto, matando 38 e ferindo centenas.
Depois do golpe militar de 12 de Setembro de 1980, protagonizado pelo general Kenan Evren, Ecevit foi preso e suspenso da vida política activa para sempre. Um referendo em 1987 ilibou-o e tornou-se o presidente do Partido da Esquerda Democrática (DSP) em 1989, herdando o posto da sua mulher, Rahşan Ecevit. O seu partido falhou a entrada na assembleia nacional nas várias eleições que se seguiram, mas venceu finalmente a barreira eleitoral nas eleições nacionais de 1995. Foi vice-primeiro-ministro durante o último governo de Mesut Yılmaz e depois foi por pouco tempo presidente do governo provisório na corrida às eleições gerais de 1999. Nessas eleições, o partido de Ecevit ganhou o maior número de assentos parlamentares, e Ecevit tornou-se primeiro-ministro em coligação com o Partido da Terra Mãe (Ana Vatan Partisi) de Mesut Yilmaz, e o Partido do Movimento Nacionalista (MHP) de Devlet Bahçeli. O governo de Ecevit levou a cabo várias reformas, com o objectivo de estabilizar a economia turca durante a preparação para as negociações de adesão à União Europeia. Contudo, a agonia económica despoletada pelas suas reformas, causou atritos dentro da coligação e partido, e forçou novas eleições em 2002. Ecevit, nessa altura visivelmente fragilizado, não conseguiu levar o seu partido para a assembleia nacional. Reformou-se da vida política activa em 2004.

Bülent Ecevit dedicou os últimos 49 anos da sua vida de 81 anos à política, mas foi também um poeta e escritor. Estudou Sânscrito, Bengali e Inglês e traduziu para Turco obras de Rabindranath Tagore, T. S. Eliot, e Bernard Lewis. Estudou no American Robert College, o mais prestigiado liceu de Istambul, e triunfou na via literária apesar de não possuir nenhuma licenciatura, facto que fez com que nunca se pudesse candidatar a presidente da república da Turquia. No entanto, frequentou o curso de direito, que abandonou para ingressar no curso de literatura inglesa na universidade de Ancara, que acabou por nunca concluir.
Sentiu-se mal a 17 de Maio deste ano durante o funeral do juiz Mustafa Özbilgin, assassinado no Conselho de Estado em Ancara. Quem conhecia Ecevit, disse naquele dia que ele tinha decidido ignorar a sua própria doença para ir ao funeral do juiz Özbilgin. O ataque no Conselho de Estado, organismo que sempre protegeu os valores básicos da república, era demasiado importante para ser ignorado.
Foi alvo de tentativas de assassinato em Izmir e nos Estados Unidos, onde balas que lhe eram dirigidas, só não o atingiram por escassos milímetros. Relativamente a Chipre, Ecevit foi quem tomou a decisão histórica e que a fez avançar. Em Março de 1971, abandonou a liderança do Partido Republicano do Povo (CHP) por não querer trabalhar lado a lado com o poder militar que tinha vindo para o poder através de um golpe de Estado. Adoptou uma posição ainda mais importante durante o período do 12 de Setembro de 1980, altura do golpe de Estado na Turquia. Foi o único político que protestou abertamente contra as condições extremamente limitadoras trazidas pela liderança militar no poder, e foi também a única voz intelectual que se levantou. Por essa via, Ecevit produziu a revista "Arayış" para fazer ouvir a sua voz. Foi preso duas vezes pelo que escreveu na revista e por declarações que nunca esconderam o que se estava a passar na Turquia.

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