13 setembro 2010

Referendo aprovou alterações à constituição

Cerca de 50 milhões de eleitores turcos foram ontem convocados para um referendo sobre emendas à constituição turca. Encarado por muitos como um teste de confiança ao governo conservador pró-islâmico do Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP), o projecto, que inclui 26 emendas, tem como objectivo central a redefinição das relações de força entre o poder político e a hierarquia judicial e eliminar a herança da constituição de 1980, elaborada durante o regime de ditadura militar. "Uma das grandes mudanças do pacote de reformas passará por romper com o sistema de castas do poder judicial", disse, sob anonimato, um conselheiro do primeiro-ministro turco, à CNN.
Ao fim do dia, o primeiro-ministro Recep Tayyip Erdoğan acabou por confirmar os números que se esperavam: 58% dos turcos aprovaram a revisão constitucional. "O 12 de setembro será um ponto de viragem na história democrática da Turquia", disse, referindo ainda que "o povo escreveu uma etapa histórica".
Defendendo que as alterações à constituição iriam levar uma maior liberdade e democracia ao país, Erdoğan esgotou as últimas horas de campanha, na sexta-feira, a percorrer Istambul para tentar convencer os indecisos: "Existirá algo mais inteligente e significativo do que a passagem de uma constituição de golpe de Estado para uma constituição das pessoas?", questionou Erdoğan, referindo-se ao facto de que o documento em vigor foi introduzido na sequência do golpe militar de 12 de Setembro de 1980 - ou seja 30 anos antes da realização do referendo. Entre as medidas, destacam-se alterações ao sistema judicial, restrições ao poder dos tribunais militares, a abolição da imunidade que protege os líderes do golpe de Estado, igualdade de géneros e uma maior protecção de crianças, idosos e deficientes.
Segundo os analistas, o referendo materializa o último confronto entre o partido islâmico de Erdoğan e a tradição secular turca, que há oito anos (altura em que o AKP assumiu a liderança do país) disputam o poder. "Começou como um referendo sobre uma reforma constitucional, mas rapidamente se tornou num confronto entre governo e oposição", explicou o jornalista, Andrew Finkel, residente em Istambul. Enquanto o Partido Republicano do Povo (CHP, "pró-laico") e o Partido de Acção Nacionalista (direita) apelaram à rejeição das refomas em nome da "separação de poderes", a formação pró-curda Partido da Paz e da Democracia (BDP) exigiu o boicote.
"Independentemente de quem ganhar, a guerra não vai parar", garantiu Mustafa Avci presidente adjunto do BDP.
"Ninguém escuta ninguém. Muitos não sabem o que vão votar. Uma polarização tão profunda, exacerbada pela retórica dos líderes políticos na campanha, constitui uma séria ameaça para a democracia neste país, já tão polarizada sobre assuntos como o laicismo, as tensões com a minoria curda ou outros", afirmou um observador à agência EFE.
Ontem houve vários momentos de tensão no sudeste da Turquia, quando as forças de segurança enfrentaram activistas turcos que tentavam boicotar a ida às urnas. Segundo a agência turca Anadolu, 50 pessoas foram detidas nas províncias de Van e Batman por quererem forçar os eleitores a boicotar o referendo. Já a agência pró-curda Fırat informou que as forças de segurança obrigaram os activistas a votar, uma vez que o voto é exigido pela legislação turca.
A Comissão Europeia definiu a revisão constitucional turca como "um passo na boa direcção" apesar de ter alertado que "será decisiva a forma como for aplicada". Os sectores "laicos" da Turquia encaram a reforma com muita apreensão, ao contrário do governo que assegura que a iniciativa política é um "passaporte" para o país poder aderir à União Europeia e contribuirá para "desmilitarizar" a Turquia e melhorar a democracia no país.

(Fonte: i)

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