03 junho 2009

Rejeição da adesão turca utilizada como argumento eleitoral

A Turquia (72,5 milhões de habitantes), candidata à UE desde o Conselho Europeu de Helsínquia em 1999, iniciou as negociações de adesão em Outubro de 2005 e em 2008 o Conselho aprovou uma revisão da parceria de acesso, mas os principais dossiers permanecem estagnados ou ainda não foram iniciados.
Contudo, a Turquia possui uma longa tradição de contactos com as instituições europeias. Em 1963, a então Comunidade Económica Europeia (CEE) assinou com Ancara um acordo de associação para o estabelecimento progressivo de uma união aduaneira. Em Dezembro de 2006, e devido à recusa de Ancara em aplicar à República de Chipre o protocolo adicional do acordo de associação, o conselho europeu decidiu bloquear a abertura de oito capítulos negociais considerados “relevantes”.
Deste modo, a adesão turca também está intimamente relacionada com a questão de Chipre, sobretudo após a integração da República de Chipre (a “parte grega” da ilha, internacionalmente reconhecida) no grande alargamento de 2004. Nesta ilha dividida do Mediterrâneo oriental aumentam os receios de uma separação de facto das duas entidades cipriotas, sobretudo após a vitória da corrente nacionalista nas eleições que decorreram na auto-denominada República Turca de Chipre do Norte (RTCN), apenas reconhecida por Ancara e ocupada por forças militares turcas desde a invasão de 1974. Um argumento de peso que as autoridades da Turquia sempre utilizarão no seu processo negocial com Bruxelas.
As negociações com Ancara prosseguem a um ritmo muito lento, não apenas devido à actual e aparente falta de entusiasmo da parte turca, mas também pelos sinais emitidos por países decisivos da União: em Abril passado, o presidente francês Nicolas Sarkozy voltou a opor-se à adesão turca, enquanto a chanceler alemã Angela Merkel manifestava preferência por uma “parceria privilegiada” com Ancara, em alternativa à adesão plena.
O sentimento anti-adesão reforça-se em simultâneo na Europa e na Turquia, e não apenas entre os sectores ultra-nacionalistas, que também criticam a “hipocrisia” em torno de uma solução para Chipre.
Analistas têm notado que os políticos europeus conservadores estão a utilizar a questão da adesão turca como um argumento eleitoral para compensar os efeitos da persistente crise económica e o seu próprio desgaste político. Contudo, em Ancara considera-se que o líder francês e a chanceler alemã estão a violar os compromissos legais da UE em relação à Turquia.
Apesar de o tom anti-turco poder diminuir após as eleições europeias de 7 de Junho, receia-se que estas declarações provoquem um impacto de longo prazo na perspectiva de integração e comprometam o apoio público na Europa para a adesão. Numa recente entrevista, Sarkozy considerou que “o alargamento da Europa não pode prosseguir para sempre, e não devemos dar à Turquia mais falsas promessas”.
Neste contencioso, todos os argumentos são válidos. Durante a recente cimeira de Abril dos 28 Estados-membros da NATO em Estrasburgo (Croácia e Albânia foram integradas na organização), a Turquia colocou fortes objecções à eleição do novo secretário-geral e ex-primeiro-ministro dinamarquês, Anders Fogh Rasmunssen, opositor da entrada da Turquia na União e que irritou os muçulmanos ao apoiar o direito de caricaturar o profeta Maomé.
As reticências de Ancara face à designação do novo secretário-geral da NATO, depois retiradas após cedências mútuas, suscitaram perplexidade nas capitais europeias e colocaram uma questão simples: se um país com o peso e a dimensão da Turquia adoptou esta atitude na cimeira dos aliados atlânticos, que comportamento poderá demonstrar na qualidade de estado membro de pleno direito da UE?
Em paralelo, a iniciativa da União para uma nova parceria a leste, que inclui os três estados do Caúcaso (Arménia, Azerbaijão e Geórgia) e ainda Bielorrússia, Ucrânia, Moldávia, colide com uma zona geoestratégica de “interesse vital” para Ancara e Moscovo. Assim, e como também tem sido sublinhado, as políticas da UE face à Turquia e Rússia nunca poderão deixar de estar presentes quando se impulsionarem as relações com os países incluídos na parceria a leste.
Com os vizinhos “não-europeus” do sul (um vasto arco mediterrânico que se estende de Marrocos à Síria) foi também decidido reforçar a cooperação através de uma iniciativa paralela, a união para o Mediterrâneo, que ocorreu durante a presidência francesa (Julho de 2008).
A política de vizinhança a sul abrange um vasto leque de países da orla do Mediterrâneo: Marrocos, Argélia, Tunísia, Líbia, Egipto, Israel, território palestiniano ocupado, Líbano, Jordânia e Síria. Para além de uma parceria e acordo de cooperação com o Iraque.
A situação geográfica destes países exclui-os de qualquer perspectiva de adesão plena.

(Fonte: Açoriano Oriental)

Sem comentários: