29 janeiro 2007

Advogado termina greve de fome ao fim de 293 dias


O advogado Behiç Aşçı, terminou uma greve de fome de 293 dias, depois do Governo turco ter decidido diminuir o isolamento dos presos políticos.
Behiç Aşçı, de 40 anos, terminou a greve de fome e concordou ser levado para um hospital de Istambul para fazer tratamento, depois do ministro da Justiça ter despachado um decreto na passada segunda-feira, a duplicar o tempo de socialização dos presos nas cadeias turcas de segurança máxima.
Na Turquia, quem utiliza a greve de fome como forma de protesto, geralmente bebe chá e água com sal ou açúcar e toma vitaminas para prolongar o tempo do protesto. O protesto deste advogado visou forçar o Governo a melhorar as condições nas prisões de tipo F, onde os acusados de crimes e de terrorismo são encarcerados em celas destinadas a uma a três pessoas. O porta-voz do Parlamento turco, Bülent Arınç, tinha prometido no mês passado à família de Behiç Aşçı rever as condições dessas prisões.
No momento em que Aşçı foi transportado para o hospital, dezenas de apoiantes gritaram que a sua luta contra o sistema das prisões de alta segurança iria continuar.
Na passada segunda-feira, o ministro da Justiça duplicou de cinco para dez horas por semana o tempo em que os presos se podem encontrar, e aumentou de quatro para dez o número de presos que podem estar juntos durante o tempo de socialização. Para os activistas de direitos humanos esta decisão não é suficiente, e pedem a abertura permanente das portas que ligam cada três celas, de forma a permitir maior socialização.
As prisões de tipo F causaram controvérsia desde que foram criadas em 2000, com críticos a dizerem que promovem o isolamento dos presos e os tornam vulneráveis aos maus tratos por parte dos guardas prisionais.
A criação do novo sistema nas prisões turcas provocou revoltas dos presos, com soldados a usarem armas de fogo e gás para conseguirem transferir os presos para as novas celas. Os presos responderam com armas de fogo e alguns atearam fogo a si próprios, tendo morrido 32 prisoneiros e dois soldados durante os confrontos. Outras 68 pessoas, incluindo presos e os seus apoiantes, morreram à fome em resultado de uma greve de fome rotativa levada a cabo por 2000 presos durante o auge do protesto que esmoreceu em 2003.
Aşçı é um advogado de membros do Partido/Frente Revolucionária de Libertação Popular(DHKP-C), um grupo de resistência de extrema esquerda considerado organização terrorista por Ancara e que foi responsável pela organização dessa greve de fome em massa.
O ministro da Justiça, Cemil Çiçek, expressou no Parlamento o seu agrado pelo fim da greve de fome de Behiç Aşçı. “Um ser humano nunca deveria ser colocado numa posição de arriscar a sua vida para mostrar que algo está errado. Não é correcto seguir alternativas tão drásticas, quando existem caminhos melhores para resolver um problema. Existem muitas maneiras para mostrar que algo está errado num país democrático. Arriscar uma vida humana é a última coisa que queremos. A vida humana é importante para nós.”

28 janeiro 2007

O último adeus a Hrant Dink


Na passada terça-feira realizou-se o funeral do jornalista Hrant Dink. Foi acompanhado, na sua última viagem pelas ruas de Istambul, por milhares de pessoas e por uma nuvem de pombas brancas.
Desde o princípio da manhã, muitas pessoas foram-se juntando à porta do jornal "Agos", para depositarem velas e cravos vermelhos em redor dos seus retratos, e também para escutarem as palavras da sua esposa, Rakel Dink, que, rodeada pelos três filhos do casal, leu uma carta de despedida ao marido.
Depois da cerimónia no jornal "Agos", teve início o lento cortejo com cerca de 200 000 pessoas, uma marcha de oito quilómetros até à igreja arménia da Virgem Maria. A multidão caminhou a maior parte do tempo em silêncio, e muitas pessoas empunhavam pequenos cartazes negros onde se lia "somos todos Hrant Dink", "somos todos Arménios", “assassino 301”. Muitos dos cartazes estavam escritos em Turco, mas também era visível um número significativo de cartazes escritos em Curdo e Arménio.
Às 14 horas realizou-se a cerimónia religiosa na igreja arménia da Virgem Maria, celebrada pelo arcebispo Sahan Sivaciyan, e com a participação do patriarca arménio Mesrob II, que proferiu algumas palavras muito emocionadas. O Governo esteve representado pelo ministro do Estado e vice-primeiro-ministro, Mehmet Ali Şahin, e pelo ministro do Interior Abdulkadir Aksu. O primeiro-ministro turco não compareceu, porque a cerimónia fúnebre coincidiu com a visita do primeiro-ministro italiano, Romano Prodi, à Turquia. Também estiveram presentes muitos deputados do Parlamento turco e líderes de partidos políticos, nomeadamente o deputado do Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP, no Governo) Nusret Bayraktar, o presidente do Partido da Esquerda Democrática (DSP) Zeki Sezer, e o líder do Partido Terra Mãe (ANAVATAN), Erkan Mumcu. O anterior presidente da Câmara Municipal de Istambul, Ali Müfit Gürtuna, o líder da comunidade judaica, Ishak Haleva, artistas e figuras eminentes da vida cultural turca, nomeadamente os escritores Elif Şafak e Can Dündar, também marcaram presença. Estiveram igualmente presentes várias personalidades internacionais, como foi o caso do chefe das igrejas arménias da Roménia e Bulgária, Gatağigos Karatekin II, os representantes religiosos dos Arménios na América, Diyayr Sırpazan Mardikyan e Viken Sırpazan, Claudia Roth do Partido Verde alemão, entre outros. Depois do serviço religioso, seguiu-se novo cortejo, desta vez para o cemitério arménio Balıklı, em Zeytinburnu.

23 janeiro 2007

As "ofensas" de Hrant Dink à "identidade turca"



Hrant Dink escreveu uma série de artigos nos quais apelava aos Arménios da diáspora para pararem de se preocupar com os Turcos e se preocuparem em vez disso com a felicidade da Arménia, de acordo com uma jornalista do jornal "Agos". Ainda segundo a mesma fonte, Hrant Dink disse aos Arménios que a sua inimizade para com os Turcos "tem o efeito de envenenamento do seu sangue". O tribunal terá interpretado este artigo fora de contexto, assumindo erradamente que ele queria dizer que o sangue turco é venenoso.
Em 7 de Outubro de 2005, Hrant Dink foi condenado, de acordo com o artigo 301 do Código Penal turco, por "insulto à identidade turca". Dink anunciou que iria recorrer da sentença, acrescentando que abandonaria o país se a condenação não fosse anulada. Foi condenado a uma pena suspensa de seis meses, o que significa que se voltasse a repetir a ofensa seria condenado a uma pena de prisão. Dink viveu na Turquia durante toda a sua vida, e na altura da condenação apareceu na televisão em lágrimas, negando as acusações de que era alvo, e prometendo combatê-las. Nessa altura Dink disse: “Vivo juntamente com os Turcos neste país e estou em completa solidariedade com eles. Penso que não poderia viver com o facto de os ter insultado." O tribunal disse que o artigo de Dink "não era uma expressão de opinião com o objectivo de criticar, mas era considerado insultuoso e ofensivo". Dink disse que a sentença se tratava de uma tentativa para o calar. "Mas eu não me calarei," disse. "Enquanto viver aqui, continuarei a dizer a verdade, tal como sempre fiz." Dink disse que iria apelar para o Supremo Tribunal da Turquia e para o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, se necessário. "Se é um dia ou seis meses ou seis anos, tudo é inaceitável para mim," disse. "Se não for capaz de ter um resultado positivo, será honroso para mim deixar este país."
Em Dezembro de 2005, um tribunal turco abriu um novo processo contra Hrant Dink pelos comentários que fez relativamente à sentença anterior que lhe foi dada pelo tribunal por ter "denegrido a identidade turca". O processo foi aberto na sequência de uma queixa apresentada ao tribunal por um grupo de advogados nacionalistas, contra Hrant Dink e três outros jornalistas também do jornal "Agos", alegando que estes “tentaram influenciar o sistema judiciário" através dos seus artigos. O caso foi enviado para o Tribunal de Recurso. A Associação dos Advogados Nacionalistas pediu ao tribunal para abrir um processo contra os quatro jornalistas, que, a serem condenados enfrentariam uma pena de nove meses a quatro anos e meio de prisão. Dink disse nessa altura que estava no seu direito de criticar o veredicto anterior, acrescentando que levaria o caso ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos se o Tribunal de Recurso confirmasse a decisão.
Dink foi também julgado em 2006 por declarações que proferiu numa conferência de minorias e direitos humanos em 2002, em que criticou o hino nacional turco e o juramento diário feito pelas crianças turcas nas escolas primárias, que dizem: "Feliz é aquele que se chama a si próprio Turco”. Dink disse nessa conferência que não se sentia Turco, mas sim um Arménio que por acaso é cidadão turco. Também criticou nessa altura uma frase do hino nacional turco que diz: "Sorri para a minha raça heróica", dizendo que a ênfase dada à raça era uma forma de discriminação. Hrant Dink seria condenado a três anos de prisão se fosse considerado culpado das acusações de que foi alvo. Explicando as declarações que proferiu nessa conferência, disse que se tratou de uma resposta a uma questão sobre o que sentiu quando, na escola primária, teve de dizer a frase com a qual se iniciam as aulas. O verso patriótico que todas as crianças do ensino primário têm de memorizar e recitar na Turquia, começa assim: "Eu sou Turco, sou honesto, sou trabalhador”. "Eu disse que era um cidadão turco, mas que era Arménio, e que embora fosse honesto e trabalhador, eu não era Turco, mas sim Arménio," Dink explicou. Disse que também criticou uma linha do hino nacional turco que fala sobre "a minha raça heróica". "Eu disse que não gostava de cantar essa parte, porque sou contra o uso da palavra raça, que leva à discriminação," disse Dink.

Reacções da Turquia ao assassínio de Hrant Dink


Na Turquia, um vasto número de políticos e centenas de organizações da sociedade civil continuam a condenar o assassínio do jornalista turco-arménio Hrant Dink.
“Actos desumanos como este nunca atingirão os seus objectivos,” disse o presidente Ahmet Necdet Sezer.
O primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdoğan, felicitou as autoridades de segurança pela captura do suspeito do crime “em nome do país, em nome da luta pela democracia e liberdade”. Acrescentou ainda que "a nossa expectativa é a captura dos autores deste ataque, que entristeceu profundamente a nossa nação.”
O presidente do Parlamento, Bülent Arınç, condenou o assassínio e disse que “este ataque perverso, insidioso e deliberado tem como objectivo a destruição do futuro e felicidade da Turquia”.
O ministro turco do Interior, Abdülkadir Aksu, disse que o assassínio constituiu um ataque contra a democracia, paz e fraternidade. Condenou o crime e apresentou condolências à família.
O líder do Partido Republicano do Povo (CHP), Deniz Baykal, disse que o assassínio de Hrant Dink causou “a mais profunda e sincera agonia” em todo o país e em todos os sectores da sociedade. Durante uma visita ao patriarca arménio Mesrob II, Baykal apresentou condolências à comunidade arménia na Turquia. Em conversa com os jornalistas depois da visita, Baykal disse que o evento podia ajudar ao tão ansiado ambiente de paz, liberdade e fraternidade na Turquia. “Eu penso que foi o que aconteceu depois deste doloroso incidente. Devíamos prolongar este sentimento. Devíamos aprender com este incidente a criar um ambiente de solidariedade, amor e paz na Turquia.”
O deputado do Partido da Terra Mãe (ANAVATAN), Mehmet Erdemir, disse que o crime foi perpetrado por aqueles que tentam provocar a desintegração da Turquia.
O presidente do Partido Social Democrata do Povo (SHP), Murat Karayalçın, num congresso do partido no domingo, congratulou as forças de segurança pela captura do criminoso, contudo, criticou a inércia do Estado. “Não se espera por um pedido para se proteger alguém. Proteger é o dever das forças de segurança. Elas deveriam fazer o seu trabalho.”
O deputado do Partido do Movimento Nacionalista (MHP), Ali Işıklar, disse que os “poderes estrangeiros” estiveram por detrás do assassínio de Hrant Dink. “De acordo com a situação actual da Turquia, a tensão no Médio Oriente e o processo da União Europeia, fazem-se tentativas para mudar a agenda da Turquia, alimentadas por poderes estrangeiros.”
O líder do Partido Independente (Hür Parti), Yaşar Okuyan, disse que o crime foi um acto contra a Turquia. “Perturbou a Turquia,” disse Okuyan, sublinhando que quaisquer ligações que possam existir com outros grupos, devem ser reveladas o mais rápido possível.
O presidente do Partido da Felicidade (SP), Recai Kutan, disse que a Turquia está no caminho da desintegração, acrescentando que “o assassínio de Hrant Dink faz parte desse processo”.
O deputado do Partido da Felicidade (SP) e anterior ministro da Justiça, Şevket Kazan, condenou o assassínio, mas também criticou os protestos nas ruas e a comunicação social turca por usar expressões como “somos todos Hrant”, “somos todos Arménios”. Kazan disse, “nós somos Mehmet, Hasan e Hüseyin, não somos Hrant, não somos Arménios. Isso equivale a dizer que somos servos [de outras nações]. Isso não pode acontecer.” Kazan também disse que a CIA e a Mossad estão por detrás do assassínio de Hrant Dink.
O dirigente do Partido da Grande Unidade (BBP), Muhsin Yazıcıoğlu, condenou o crime e felicitou as forças de segurança por terem capturado o autor do crime, contudo, disse que averiguar quem está por detrás do crime tem de ser uma prioridade. Yazıcıoğlu também negou que o assassino tenha quaisquer ligações com as organizações juvenis do seu partido. Condenou os jornais “que põem notícias difamatórias a circular, num momento em que o que a Turquia mais precisa é unir-se em solidariedade”.
Ali Müfit Gürtuna, que dirige o recém criado Movimento Turkuaz, apresentou condolências à Turquia e à comunidade arménia na Turquia.
Entretanto, centenas de pessoas permanecem no local onde Hrant Dink foi morto, acendendo velas e depositando flores em redor do seu retrato. Alguns grupos gritam frases de protesto a condenar o seu assassínio.
Desde o momento em que Hrant Dink foi assasinado, não param as marchas de pesar em muitas cidades turcas, nomeadamente na cidade natal de Hrant Dink, Malatya.

22 janeiro 2007

O último artigo de Hrant Dink no jornal "Agos"

"A Ironia da História" por Hrant Dink in jornal "Agos"

Vamos primeiro repetir as notícias: a data de abertura da igreja arménia de Surp Haç na ilha de Ahtamar em Van, que foi restaurada no ano passado mas que continua fechada, foi adiada pela terceira vez. Numa declaração escrita do governador de Van, foi anunciado que a Igreja de Ahtamar, cuja restauração está completa, será aberta ao turismo a 11 de Abril. Também foi dito que a cerimónia de abertura, que terá convidados internacionais, será organizada pelo governador de Van e pelo ministério do Turismo.

Há dez anos, dirigi aos representantes do Governo em Van com a minha paz, "O Batalhão de Trabalhadores de Ahtamar", e disse: "Em vez de criar 'monstros' para atrair turistas preste atenção aos sinais históricos que estão à frente dos seus olhos. Por que é que alguém precisa de dar passos errados? Van é um paraíso de herança histórica. Porque é que não nos sentamos e pensamos sobre como restaurar esta região? 'Os Arménios virão', dizem. E então? Deixem-nos vir e ver os lugares dos seus antepassados. O que é que isso tem de errado?" E eu acrescentei: "Se precisa de ajuda, nós estamos prontos para ajudar. Oh história! Oh futuro! A juventude na Turquia, Arménia e na diáspora são voluntários. O batalhão de trabalhadores de Ahtamar está pronto para as suas ordens... Sabe disso. Vem, vamos restaurar a igreja de Ahtamar meramente como um edifício. Vamos também restaurar as nossas almas corroídas."

Finalmente, passados dez anos, o restauro de Ahtamar está terminado. Nós adorariamos ver a Turquia e a Arménia a cooperar neste restauro. Mas, infelizmente não foi o caso. De qualquer forma, é necessário mencionar e agradecer o trabalho meticuloso do director do projecto, Cahit Zeydan, que tentou trazer peritos da Arménia para consulta, e pôde adicionar ao projecto o arquitecto turco-arménio Zakarya Mildanoğlu. Eles fizeram o seu melhor e um magnífico trabalho. No entanto, os burocratas e os políticos estragaram isso. Não foram capazes de concretizar a abertura da igreja. Primeiro adiaram a abertura anunciada para 4 de Novembro de 2006 para Abril de 2007 devido às "condições climatéricas". Depois Atilla Koç, o ministro do Turismo, anunciou que a cerimónia terá lugar a 24 de Abril. Depois veio a reacção a esta data. O patriarca arménio Mutafyan declarou que "nenhum Arménio, incluindo eu, assistirá à cerimónia se esta acontecer a 24 de Abril."

Na semana passada o assunto foi discutido no Parlamento. O deputado do CHP por Izmir, Erdal Karademir, perguntou se o facto da cerimónia de abertura ser a 24 de Abril, o aniversário do genocídio arménio, era o resultado de uma política específica do AKP. A imprensa nacionalista, por outro lado, colocou a abertura da igreja nas suas manchetes como "a abertura traidora em Van". E agora a data está agendada para 11 de Abril. É possivel colocar um trabalho certo num caminho errado com tanto sucesso. O motivo escondido impossível de esconder não podia ser mais revelador. Uma verdadeira comédia… Uma verdadeira tragédia… O Governo ainda não foi capaz de fazer uma aproximação correcta à "questão arménia”. O seu verdadeiro objectivo não é resolver o problema, mas sim ganhar pontos como um pugilista numa luta. Como e quando é que irá fazer o movimento correcto e derrotar o seu oponente. Esta é a única preocupação. Isto não é seriedade. O Governo chama historiadores arménios para discutir a história, mas não se envergonha de julgar os seus intelectuais que possuem uma retórica não ortodoxa sobre o genocídio arménio. Restaura uma igreja arménia no sudeste, mas só pensa, "como é que posso usar isso para obter conquistas políticas no mundo, como posso vender isso?" A mudança da data de abertura da igreja para o dia 24 de Abril constitui uma indicação clara do seu pensamento desonesto.

E agora preste atenção! Enquanto que a rejeição vinda da ala nacionalista e mesmo do patriarca arménio relativamente à data de abertura cria uma oportunidade de corrigir o erro, uma ironia da história aparece em cena. A ironia diz, "uma vez que mostraste irresponsabilidade, acrescenta ainda mais", e revela que a nova data escolhida, 11 de Abril, é de facto 24 de Abril! O dia 11 de Abril de 1915 é exactamente o dia 24 de Abril da actualidade, devido à diferença entre o calendário antigo e o calendário novo. Não admira que a data 24 de Abril seja uma adição à literatura arménia, com o surgir do novo calendário. Essa data, na qual os intelectuais e líderes arménios foram enviados para o esquecimento, foi de facto 11 de Abril de 1915. Agora permanece uma questão: irão aqueles que acharam o 24 de Abril problemático e que optaram por 11 de Abril voltar a escolher uma nova data? Ou poder-se-ia perguntar desta forma: tem a certeza? É esta a sua decisão final?"

21 janeiro 2007

Foi assassinado o jornalista e activista de ascendência arménia Hrant Dink


O jornalista e activista Hrant Dink, um cidadão turco de ascendência arménia, julgado em 2005 e em 2006 por “insulto à identidade turca”, foi assassinado na passada sexta-feira, em Istambul, à entrada do edifício do jornal "Agos", que dirigia desde 1996. Hrant Dink era editor-chefe e colunista do jornal "Agos", um jornal bilingue escrito em Turco e Arménio.
Foi alvejado três vezes no pescoço e cabeça e teve morte imediata. Dois suspeitos foram entretanto detidos nesse mesmo dia, e há poucas horas foi capturado o presumível assassino.
Trata-se de um adolescente, de nome Ogün Samast. Desde o princípio da tarde de ontem, que têm sido divulgadas imagens deste jovem, filmadas na altura do crime por uma câmara de vigilância localizada nas imediações do local do crime. Durante todo o dia os vários canais de televisao turcos divulgaram essas imagens e forneceram números e um endereço electrónico para contacto, numa verdadeira caça ao homem. Quando viu as imagens divulgadas na televisão, o pai do jovem dirigiu-se à polícia dando, ao que tudo indica, pistas sobre o paradeiro do filho. Há cerca de uma hora, o primeiro-ministro Erdoğan falou em directo na televisão, dizendo: “Agradeço à polícia pelo sucesso na captura do suspeito num período tão curto de tempo.”
Ogün Samast tem 17 anos, e foi capturado num autocarro na cidade de Samsun, onde seguia a caminho de Trabzon, a cidade onde vive. Foi capturado 32 horas após o crime. O governador de Istambul, Muammer Güler, referiu que Samast será levado para Istambul para ser interrogado.
Serkis Seropyan, um funcionário do jornal "Agos", disse à agência noticiosa "Anatólia" que alguém chamou Dink para se dirigir à porta do edifício do jornal. Passado pouco tempo, ouviram-se tiros e Dink caiu, de acordo com testemunhas. “Alguém disparou três tiros contra ele em frente à porta,” referiu Seropyan. Uma testemunha disse que um jovem disparou contra um homem que estava a fugir, aparentemente Dink. Foram encontradas quatro balas na cena do crime, embora as testemunhas tenham referido que só ouviram três tiros, revelou o canal de notícias "NTV". Após os disparos, o corpo de Dink permaneceu no local do crime durante algumas horas, antes de ter sido levado numa ambulância.
Um grupo de cerca de 60 pessoas protestaram, marchando na Praça Taksim, no coração de Istambul, depois do corpo de Dink ter sido levado. Durante a tarde de sexta-feira e todo o dia de sábado, sucederam-se, um pouco por toda a Turquia, numerosas manifestações de pesar e de protesto contra a morte de Hrant Dink. As manifestações repetem-se em algumas partes do mundo, nomeadamente na Alemanha, onde vive um número significativo de cidadãos turcos. No local da sua morte, à porta do jornal "Agos", mantém-se uma vigília, com fotografias suas, velas acesas e flores.
Hrant Dink estava a receber ameaças e já tinha apresentado queixa na esquadra de Şişli, referiu Erdal Doğan, um dos seus advogados, ao canal de televisão "CNN Türk". Doğan acrescentou que Dink estava particularmente preocupado com a sua segurança, mas rejeitou conselhos para abandonar a Turquia, confiante de que a sua segurança seria garantida. À pergunta se o assassínio de Dink foi um acto de provocação, Doğan disse que os actos de provocação começaram há dois anos. “Esta morte, adivinhava-se,” disse.
O primeiro-ministro, Recep Tayyip Erdoğan, deu uma conferência de imprensa a seguir ao crime. Disse que este assassínio é altamente simbólico, numa altura em que o alegado genocídio arménio está na agenda internacional. Erdoğan apresentou as suas condolências: “Este ataque é contra todos nós, contra a nossa unidade, paz e estabilidade. Foi disparada uma bala contra o pensamento livre e contra a nossa vida democrática […] Nós temos vivido juntos e em paz durante anos. Nenhum plano bárbaro irá destruir isso,” disse Erdoğan.
Hrant Dink nasceu em Malatya, na Turquia, a 15 de Setembro de 1954. Era mais conhecido como colunista e editor-chefe do jornal "Agos", um semanário publicado desde 1996 em Turco e em Arménio. Com sete anos foi viver para Istambul com a sua família. Em Istambul, os seus pais divorciaram-se e foi viver para o orfanato arménio em Gedikpaşa, em Istambul, com os seus dois irmãos. A sua educação até ao ensino secundário foi feita em escolas arménias. Logo após ter terminado o ensino secundário, casou-se com Rakel, uma amiga de infância do orfanato com quem teve três filhos. Licenciou-se em Zoologia na Faculdade de Ciências de Istambul. Para cumprir o serviço militar, esteve oito meses no Regimento de Infantaria Naval Turca em Denizli. Depois deu continuidade aos seus estudos, também na Universidade de Istambul, mas no departamento de Filosofia. Começou a publicar o semanário turco-arménio "Agos" a 5 de Abril de 1996, para estabelecer uma ponte de comunicação e de compreensão entre a maioria da população turca e a comunidade turco-arménia que ele dizia viver muito isolada. Tentou fazer do jornal "Agos" uma voz democrata e de oposição na Turquia, e também partilhar as injustiças praticadas contra a comunidade arménia. Participou em várias plataformas democráticas e em organizações da sociedade civil. Foi julgado e condenado na Turquia por "insultar a identidade turca", acusações que sempre negou.

16 janeiro 2007

Erdoğan acusa a União Europeia de falta de honestidade

O primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdoğan, disse no passado domingo que a União Europeia não está a agir honestamente em relação à Turquia, acrescentando que o Governo vai continuar a seguir o seu caminho rumo à União Europeia, apesar dos obstáculos políticos apresentados pelo bloco europeu. “Se eles nos querem bloquear, isso não tem a ver com outras razões a não ser razões políticas,” disse Erdoğan.

13 janeiro 2007

Parlamento turco rejeitou proposta de lei para proteger mulheres da violência

A Comissão de Justiça do Parlamento rejeitou uma proposta de lei que visava proteger as mulheres da violência ocorrida em relacionamentos fora do casamento legal.

Uma proposta do deputado do Partido Republicano do Povo (CHP, maior partido da oposição) Yüksel Çorbacıoğlu, para incluir no projecto de lei mulheres cujos relacionamentos não são considerados casamentos legais e que estão expostas à violência, levou a discussões na comissão parlamentar, uma vez que o projecto de lei contempla “proteger as mulheres da violência no seio da família". Ora, a definição legal de família não abrange um vasto número de mulheres que só estão casadas por meio de cerimónias religiosas, e portanto não reconhecidas legalmente.
Nimet Çubukçu, a única mulher a exercer o cargo de ministra e responsável pelas mulheres e famílias, rejeitou a proposta, argumentando que isso iria contra a definição de família na Constituição. Çorbacıoğlu pediu que a comissão ignorasse o conceito de família na lei para proteger essas mulheres e crianças que vivem sob o mesmo tecto mas não possuem laços legais ou de sangue. Reforçando a necessidade de proteger as segundas mulheres, amantes e mulheres casadas pela via religiosa contra a violência, Çorbacıoğlu disse: “Neste país, raparigas que ainda são crianças são segundas mulheres sem o seu consentimento. Todas essas relações extra-conjugais estão sob protecção na Europa."
Çubukçu, em declarações à estação de televisão "NTV", disse: “Penso que é legalmente significativo manter ‘família' conforme está definido na lei.” Referindo-se ao argumento de que nenhum ser humano exposto à violência se encontra protegido de acordo com a lei actual, Çubukçu defendeu a sua posição contra a proposta de Çorbacıoğlu, dizendo: “Mas como o nome indica, esta é uma lei para protecção das famílias.”
Em declarações ao jornal diário "Milliyet", Mehmet Küçükaşık, deputado do CHP por Bursa, referiu: “A Turquia tem um conceito de família largamente aceite. As amantes e as segundas mulheres não podem ser incluídas nesta lei. A proposta estava errada.” A deputada do CHP, Canan Arıtman, pelo contrário, apoiou Çorbacıoğlu, em declarações ao jornal diário "Vatan": “Se o objectivo aqui é proteger indivíduos da violência, então uma mulher que está exposta à violência, mesmo que esteja num casamento não considerado legal, o seu estatuto marital, educacional e etário não pode ser uma condição. É errado abrir o caminho para a violência contra algumas mulheres olhando para o seu estatuto marital.”
Entretanto, a proposta para adicionar “outros membros da família” próximos do “elemento causador do mal” na definição de “violência dentro da família”, foi aprovada por unanimidade pela comissão.
Segundo declarações anteriores de Nimet Çubukçu, 34 por cento das mulheres turcas estão expostas à violência. As organizações não governamentais também reivindicam que um terço das mulheres turcas são vítimas de violência. De acordo com uma “pesquisa da estrutura familiar”, levada a cabo pela Direcção-Geral de Pesquisa Familiar e Social e pelo Instituto de Estatística da Turquia, 7,8 por cento das mulheres casadas foram vítimas de violência doméstica. Gülsün Bilgehan, deputada pelo CHP, enviou uma petição a Çubukçu, onde questiona se os resultados da "pesquisa da estrutura familiar" são científicos e objectivos.

10 janeiro 2007

Os homens turcos vão poder ser enfermeiros

A deputada do Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP, no Governo), Zeynep Karahan Uslu, propôs a tomada de medidas para que os homens possam ser enfermeiros na Turquia, com o objectivo de eliminar a falta de elementos nesta profissão.
Esta posição é apoiada pela Organização das Enfermeiras Turcas, que pede a eliminação do terceiro artigo do actual código, que diz que “a arte da enfermagem na Turquia, só pode ser exercida pelas mulheres turcas que adquiriram o grau de enfermeiras ao abrigo deste código.”
A professora Saadet Ülker, presidente da Organização das Enfermeiras Turcas, é de opinião que “o actual código enfraquece a profissão", e acrescenta que " existem muitos homens enfermeiros, mas o seu título é oficial de saúde.”

07 janeiro 2007

Governo turco vai publicar "Dezassete Clássicos do Alevismo"

O Directorado dos Assuntos Religiosos decidiu publicar "Dezassete Clássicos do Alevismo", uma colecção de trabalhos literários alevitas. O directorado declarou que escolheu os clássicos juntamente com os líderes espirituais alevitas (dedeler).

Logo após a difusão da notícia pelos meios de comunicação social, os líderes alevitas declararam que embora tenham participado numa reunião com o directorado sobre esse assunto no final de 2005, não concordaram com a publicação dos volumes. Dizem que o directorado preparou tudo e só os consultou no final do processo para ganhar legitimidade. Referem igualmente que a maior parte dos clássicos já estavam publicados, e se mais publicações fossem necessárias, deveria ser feita pelas instituições alevitas.
Esta controvérsia tem antecedentes históricos. Os alevitas são seguidores do imame Ali, o genro do profeta Maomé. Consideram que o Directorado dos Assuntos Religiosos é uma instituição sunita que não representa a crença alevita.

A associação alevita Cem ("Cem Vakfı"), liderada por İzettin Doğan, tem mantido contactos com todos os governos no poder desde os inícios dos anos 90 para acabar com a descriminação contra os alevitas, pedindo igualdade de direitos no que diz respeito ao orçamento do directorado. O directorado recruta dezenas de milhar de imames, consigna-os às mesquitas e paga-lhes os salários. Nenhum alevita usufrui destas regalias, uma vez que não frequentam mesquitas e, por outro lado, o directorado não reconhece os alevitas. Outras actividades levadas a cabo pelo Directorado dos Assuntos Religiosos consistem na organização de peregrinações a Meca e no estabelecimento do calendário para o jejum do Ramadão. Os alevitas não participam em nenhum destes eventos, porque a sua religião não contempla a ida a Meca nem o jejum do Ramadão.
Attila Erden, da Associação Cultural Hacı Bektaş Veli refere: “Eles dizem aos alevitas para irem às mesquitas em vez de construirem casas "cem" ["cem evi", locais de culto dos alevitas]. O Directorado dos Assuntos Religiosos não atende aos pedidos dos alevitas, o que acima de tudo é desrespeitoso.”
Os líderes alevitas afirmam que o directorado desenvolve uma política no sentido de enfraquecer o Alevismo, aproximando-o do Sunismo, sendo a publicação dos volumes uma investida nesse sentido. Doğan diz que os alevitas têm sérias dúvidas quanto à selecção e autenticidade dos livros: "Trata-se de um assunto muito importante, porque em versões mais tardias dos livros, não aceites como originais, existem traços de crença sunita."
Ao que tudo indica, o directorado irá distribuir clássicos aos alevitas que não os possam comprar.
O colunista do jornal "Milliyet", Taha Akyol, disse que ficou muito feliz com a notícia inicial de que o directorado ia publicar os clássicos. "Se fossem aplicados métodos científicos de publicação, não haveriam problemas," referiu. Akyol lamenta que exista opressão à cultura alevita, pelo facto dos seus clássicos não serem bem conhecidos. Por outro lado, para Selahattin Özel, presidente da Federação das Associações Alevitas, a decisão da publicação não passa de mais um passo para o esforço histórico de assimilação. Referiu igualmente que os alevitas têm as suas próprias instituições para publicar os seus livros. Doğan mencionou o mesmo ponto, dizendo: “Nós fundámos uma organização de serviço religioso.” Referiu ainda que a publicação tem unicamente em vista o preenchimento dos requisitos impostos pela União Europeia, uma vez que no processo de adesão, os direitos dos cidadãos alevitas foram um dos tópicos mais criticados dentro da categoria dos direitos humanos.